Notícia

Reflexão sobre as motivações dos empregadores para patrocinar planos de previdência complementar fechada

Por Rogério Tatulli e Milton Antelo Filho


Nascido 4 décadas atrás para ser um instrumento de modernas políticas de recursos humanos pelas empresas, capaz de reter em especial os maiores talentos em um tempo em que o empregado tendia a ficar mais tempo na mesma organização, o sistema formado pelas entidades fechadas de previdência complementar viu a permanência dos trabalhadores no mesmo emprego encurtar-se sobremaneira, entre muitas outras transformações em um mercado de trabalho que não parou mais de mudar. E tantas são essas mudanças que, pressionados a encontrar meios de voltar a crescer, nós gestores de entidades e planos patrocinados nos sentimos obrigados a dedicar um tempo maior a pensar sobre o que resta das antigas motivações dos empregadores para patrocinar. Diga-se que sem surpresa, já que continuamos hoje como no passado nos entregando à nossa missão com muito entusiasmo, concluímos que não apenas esses motivos ainda são muitos, como vimos também existir espaço para que através dos novos formatos que estão surgindo o mundo corporativo ganhe novas opções para continuar levando previdência complementar fechada aos seus colaboradores.


Pode-se dizer mesmo que as empresas têm hoje até mais motivos para oferecer previdência complementar fechada aos seus funcionários, considerando que o atual debate sobre a reforma da Previdência Social desnudou para os brasileiros a impraticabilidade de o Estado, com as suas contas em desequilíbrio, continuar respondendo sozinho pela preservação da renda do trabalhador na aposentadoria. O presente déficit, somado à redução gradual do contingente de contribuintes, como efeito da menor natalidade, e ao maior número de beneficiários que receberão os benefícios por mais tempo, fruto da longevidade, deixa mais que claro que a partir daqui cada geração terá como tarefa cuidar de seu próprio futuro. Isso significa a entrega de um papel cada vez mais central para o regime de capitalização e outro, menor, para o de caixa, que irá aos poucos perdendo espaço diante da inviabilidade de se manter ad aeternum o pacto intergeracional, pelo qual cada geração pagaria os benefícios daquela que a antecedeu no tempo.


As entidades, cada uma em seu ambiente e, a Abrapp, ao se manifestar publicamente, ajudam de muitas maneiras os brasileiros a dar esse passo na direção do regime de capitalização e isso por si só é algo da maior importância. Com certeza, disso as patrocinadoras podem se orgulhar, de vez que estão por trás da cena viabilizando em boa parte esse esforço. Mas tudo indica que esse papel pode ir além. Por exemplo, recepcionando em seus planos, tão logo aprovado pelo Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC), familiares até o 3º grau dos atuais participantes. ou explorando as novas possibilidades que vem sendo desenhadas, como planos setoriais ou instituídos por empresas em caráter não contributório.


Qualquer que seja o formato, tradicional ou outro ainda em gestação, o que se quer preservar é aquilo que não se pode perder: a capacidade das empresas de liderar o processo, enfim, usar a sua força estruturante para fazer acontecer.


A experiência acumulada pela Ericsson e pela Promon Engenharia, patrocinadoras das entidades das quais somos dirigentes, mostra o quanto o patrocínio pode ser uma vivência positiva e enriquecedora para as organizações que a vivem. No ambiente empresarial, onde viceja uma cultura corporativa a que não faltam sementes de crescimento para todos que nela mergulham, fica imensamente mais fácil combater, por exemplo, a praga da deseducação financeira. A ideia comum e os valores compartilhados tendem da mesma forma facilitar a mobilização do grupo em favor da formação de uma poupança verdadeiramente de longo prazo.


O patrocínio é consequência da cultura organizacional, ao mesmo tempo em que é causa de seu avivamento, no sentido em que ajuda a aumentar a coesão do grupo. A participação no plano de previdência complementar termina sendo uma das formas de viver a empresa, de tão profunda e densa acaba sendo a experiência.


Impossível esquecer o caráter pioneiro das entidades patrocinadas, algumas delas nascidas nos anos 70 e muitas na década seguinte, expressando exatamente essa relação estreita. Sem esquecer que a própria criação da Abrapp, em 1978, foi fruto dessa força agregadora nascida nas empresas, nas EFPCs que criaram e no coração de seus primeiros dirigentes.


Lembrar a trajetória de nossas entidades, desde os primeiros anos, é não esquecer o quanto essa história foi o resultado de uma cultura organizacional fundada na ética nos relacionamentos, no espírito de comunidade, nos padrões de conduta, na equidade, na valorização da realização profissional e humana de seus funcionários. Documentos da época sublinhavam que, se havia o cuidado com os valores humanos compartilhados com os colaboradores, fazia, assim, todo o sentido preocupar-se com eles também na fase de aposentadoria. Dessa forma, sob a inspiração dos fundadores, nasceram EFPCs verdadeiramente coerentes com os ideais humanos preconizados pelas organizações e algo que se mantém até hoje.


Desde o plano previdenciário original, na modalidade benefício definido, até o plano atual, de contribuição definida, as entidades vêm procurando adaptar seus planos a cada momento econômico e a cada transformação vivida pela sociedade brasileira, mas sempre se mantendo fiel aos valores das patrocinadoras. Cremos ser esse um fator fundamental para a manutenção da credibilidade junto aos participantes.


O casamento perfeito entre a entidade e sua patrocinadora pode chegar a reprodução de forma igual de práticas culturalmente já consolidadas na organização, como a política de portas sempre abertas. Todo e qualquer participante tem acesso total e imediato aos diretores da fundação, para tirar dúvidas, expor preocupações ou questionamentos.


Debate criativo e respeitoso de ideias, mas inexistência de conflitos entre os membros dos Conselhos Deliberativo e Fiscal indicados pela patrocinadora e os eleitos pelos participantes, uma vez que todos buscam o consenso, são nesses casos cláusulas pétreas dos regulamentos.


Ao se deparar com alguma questão técnica específica que eventualmente não domina inteiramente, seja na área atuarial, contábil, legal, de investimentos ou outra, a entidade busca consultar profissionais de mercado com sólido conhecimento sobre aquele tema específico, de modo a formar o melhor entendimento sobre a questão e poder tomar decisões bem fundamentadas. Replica o conceito-guia vigente na patrocinadora, de “busca permanente da excelência e do conhecimento”.


Nesse momento em que a educação previdenciária se torna ferramenta estratégica para a conscientização da importância de uma poupança previdenciária, as patrocinadoras também ocupam papel relevante na formação de seus participantes ativos, abrindo espaço e agenda para que as entidades discutam diretamente com esses trabalhadores as suas dúvidas, receios e inseguranças em relação à previdência complementar.


O fato de não haver dissonância entre a cultura da patrocinadora e a forma de a entidade operar e se relacionar traduz-se, ainda, em uma tranquilidade adicional nos momentos nos quais o participante necessita tomar uma decisão importante, como a solicitação de seu benefício no instante da aposentadoria, ou a opção por tornar-se ou não auto patrocinado em caso de sua saída da patrocinadora. O participante sente-se normalmente bem seguro quanto ao respeito que continuará a ser mantido no seu relacionamento com a entidade, por vezes, durante muitas décadas.


É natural sentir assim que o respeito por aqueles valores humanos que provêm da patrocinadora materializa-se na credibilidade que a entidade desfruta não só junto aos participantes ativos, mas também junto aos mais afastados, os assistidos e auto patrocinados. E isso também em relação aos pensionistas, pessoas que não trabalharam na patrocinadora, mas que, de alguma forma, foram expostos à sua cultura.


Para a patrocinadora, o fato de a entidade praticar os mesmos princípios e valores reforça, em seus funcionários, os ideais e o espírito de comunidade sobre os quais a organização se fundamenta. E o comprometimento e a retenção dos talentos passam a ser uma consequência.




Rogério Tatulli
Diretor-superintendente da Previ-Ericsson e Diretor Executivo Suplente da Abrapp


Milton Antelo
Diretor-presidente da Fundação Promon